sábado, 26 de junho de 2010

Solidariedade para com as vítimas do "novo" PT

No lugar da ética, entraram os conselhos de Maquiavel


LEONARDO BOFF
Teólogo - iboff@leonardoboff.com.br

Passei um fim de semana lendo pela enésima vez "O Príncipe", de Maquiavel, no esforço de entender a atual política da Direção Nacional do PT. E aí encontrei as fontes que possivelmente estão inspirando o assim chamado "novo PT", aquele que trocou o poder da vontade de transformar a realidade pela vontade de poder compor-se com a realidade.
Nas palavras do candidato eleito pela convenção do partido em Minas Gerais, Fernando Pimentel, depois invalidado em nome da aliança com o PMDB, "o PT novo é o PT que faz alianças e convive com a realidade política brasileira, buscando transformá-la... Não somos mais um partido que coloca a ideologia como óculos escuros para não enxergar a realidade política; operamos com a realidade política do jeito que ela é para transformá-la" ("O Globo", 12.6.2010).
Vamos traduzir esse discurso de disfarce. A ideologia do PT originário era a ética e as reformas estruturais. O novo PT entende esse propósito como uma máscara que não permite enxergar a realidade política do jeito que ela é. Sabemos como é a política vigente, montada sobre alianças espúrias, sobre a mercantilização das relações políticas e sobre a rapinagem do dinheiro público.
Pimentel ainda acredita que, com as alianças, se pretende transformar a realidade, como se, para transformar uma gangue de bandidos, devesse fazer parte dela. No lugar da ética entraram os conselhos de Maquiavel: "ir diretamente à verdadeira realidade das coisas e não ater-se a representações imaginárias" (c. XV).
Para Maquiavel, a verdadeira realidade das coisas é a busca tenaz do poder, as formas de conquistá-lo e de conservá-lo. E aí vale tudo, os fins justificam todos os meios: o perjúrio, o crime e até o bem, se ele trouxer vantagens. As "representações imaginárias" são a ética. Ela não é posta de lado; até vale, desde que favoreça o poder. Caso contrário, pode ser atropelada: "não se afastar do bem quando se pode, mas saber usar o mal, se necessário" (c. XVIII). O importante não é ser bom, mas parecer bom. Não há porque cumprir a palavra empenhada se ela se volta contra o príncipe, pois "jamais faltarão motivos legítimos para justificar o não cumprimento de algo apalavrado" (c. XVIII).
É entristecedor ler em Pimentel que, "nesse processo de renovação, alguns companheiros vão ficar no passado". Esses, na verdade, são os portadores do futuro porque são fiéis à ética e ao sonho de uma política diferente. A direção do PT se rendeu, fazendo alianças escandalosas para se perpetuar no poder, se atolando no passado. O povo não merece ser defraudado dessa forma. Não é investindo em políticas assistenciais que se possa substituir-lhe a dignidade.
Mesmo assim, nas bases, deputados, prefeitos e vereadores do PT ético mantêm vivo o sonho e ão abandonam a questão: que Brasil queremos e de que ética pública precisamos?
Quero me solidarizar com as vítimas do maquiavelismo do "novo" PT, especialmente em Minas Gerais e no Maranhão. Neste Estado está ocorrendo uma tragédia, bem representada pelo histórico sindicalista Manoel da Conceição, de 75 anos, fundador do PT, torturado e mutilado pela polícia das oligarquias, obrigado a votar em Roseana Sarney, do PMDB. Da mesma forma quero me solidarizar com as vítimas de Minas Gerais, com Sandra Starling, com Durval Ângelo e tantos outros.
Nem tudo vale neste mundo. E se Cristo morreu, foi também para mostrar que nem tudo vale e que para tudo há algum limite, o que é válido também para o PT.
Duke

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